domingo, 22 de novembro de 2009

Para muitos, terceira não, melhor idade

O Brasil está envelhecendo.

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), até 2025 o País será o sexto país do mundo com o maior número de pessoas idosas.

O Brasil tem hoje uma população de mais de 30 milhões de pessoas com mais de 50 anos, segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Mas será que essa população, maior do que a da Venezuela, tem seus direitos respeitados e, acima de tudo, vive melhor do que seus antepassados, que tinha menor expectativa de vida?

“As necessidades básicas do idoso são as mesmas de um adolescentes: amor, calor familiar, segurança e necessidade de ser útil”, afirma José Evangelista Telles, aposentado que acaba de completar 70 anos.

“Mas enquanto na imaginação da maioria das pessoas eu deveria estar num asilo, casei mais uma vez, tenho uma filha de dois anos e voltei a trabalhar”, conta.

“Seo” José é a personificação do que o IBGE considera o novo idoso: com maior expectativa de vida e bom poder aquisitivo, as pessoas de terceira idade procuram atividades diversificadas e muitos sustentam as famílias.

Para ter idéia do poder aquisitivo que os “velhinhos” brasileiros têm, basta fazer as contas: se cada um dos idosos do último censo ganhasse apenas o salário mínimo, de R$ 300, já seria suficiente para movimentarem quase R$ 8,2 bilhões por mês, ou R$ 97,3 bilhões por ano, e isso sem contar o 13.º salário.

Mas na realidade, nessa faixa etária se encontram profissionais no auge das carreiras, o que segundo o IBGE aumenta a média de rendimento para três salários mínimos, ou R$ 24,3 bilhões mensais.

Uma pesquisa da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (USP) mostra que 35,3% dos 850 mil moradores da capital com mais de 60 anos têm rendimento de 1 a 2 salários mínimos; 15,1% de 2 a 3 salários mínimos; 10,6% de 3 a 4 salários mínimos; e 26,5% de 5 salários mínimos ou mais.

De acordo com essa pesquisa, 13% deles vivem sozinhos, 71,7% pagam pelos medicamentos que usam com o próprio dinheiro, apenas 9,7% têm remédios por meio do sistema público e 40,4% têm seguros ou planos de saúde privados.

Lazer

E com esse poder aquisitivo todo, os idosos estão se assemelhando aos do primeiro mundo e procurando aproveitar todo o tempo livre que têm.

“Seo” José tem dois filhos do primeiro casamento.

“Ambos estão na faixa dos 40 anos.

Minha filha, do segundo casamento, tem apenas dois.

Ela é mais nova do que meus netos”, diverte-se.

A filha é fruto das idas de “Seo” José aos bailes da terceira idade do Sesc, em Curitiba.

Depois que ficou viúvo, há 23 anos, achou que nunca mais iria se relacionar.

Há cerca de 5 anos, depois de uma parada cardíaca, aconselhado por um médico, começou a freqüentar uma academia de ginástica e depois, os bailes.

Em um deles conheceu a segunda esposa, Anita, que hoje tem 38 anos.

“Ela trabalhava em uma das unidades do Sesc ensinando os velhos a dançar”, conta “Seo” José.

“Aconteceu que enquanto muita gente da minha idade já aparece no obituário, meu nome estava no convite de casamento como noivo”.

Ex-empresário, “Seo” José conta que o casal faz ao menos duas grandes viagens por ano, mas que o ritmo de seu lazer tem diminuído.

“Fui obrigado a entrar no mercado de consultoria.

Um dos meus filhos ficou desempregado e assim eu ajudo a família toda a se manter”, conta.

Do alto de sua experiência acredita que bons ventos darão alento à economia.

“Na verdade, poder trabalhar sem o estresse do dia-a-dia é uma bênção.

Ainda mais se for para ajudar meus filhos.”

A sexualidade está fazendo parte do cotidiano de casais de idosos brasileiros

Além do poder aquisitivo, um medicamento que já tomou conta do imaginário popular está causando uma revolução na vida dos idosos: o Viagra.

São homens acima de 50 anos que mais contribuíram para que a Pfizer, fabricante da pílula, registrasse vendas de US$ 60 milhões em 2004.

“O Viagra causou uma revolução maior do que ser uma possibilidade de cura para a disfunção erétil.

Ele fez com que finalmente se falasse em sexo na terceira idade”, afirma o diretor da Associação Brasileira de Geriatria e professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), Gilmar Calixto.

Para o médico, a mudança está presente no cotidiano dos consultórios geriátricos.

“O geriatra hoje pergunta aos seus pacientes como vai a vida sexual. Isso não é mais tabu”, revela.

Para ele, não há motivo para vergonha.

“Claro que os idosos pertencem a uma geração que simplesmente foi ensinada a não falar sobre o assunto.

Para eles, sexo era meramente reprodutivo.

Mas como hoje eles vivem mais e têm mais tempo, o sexo acaba fazendo parte da vida.”

Para Calixto, o tabu pode deixar de fora do tratamento muita gente.

Um estudo da Universidade de Massachusetts, nos Estados Unidos, revelou que 52% dos homens entre 40 e 70 anos têm algum grau de disfunção erétil.

Segundo os médicos, homens e mulheres sentem o efeito do tempo de maneira diferenciada.

Nas mulheres idosas, os principais problemas sexuais estão associados à libido.

“As mulheres sentem mais do que o homem a educação tradicional e deixam de manter relações depois da menopausa.

Mas mulheres de 80 anos podem ter orgasmos mais facilmente do que moças de 20”, diz.

Já nos homens, a principal causa da disfunção erétil, segundo o médico, é a vida moderna.

“O estresse e as doenças que ele desencadeia são os maiores motivos dos idosos masculinos abandonarem a vida sexual.”

Calixto conta que, além de procurar regularmente um médico, alguns costumes são importantes para manter o corpo em ordem e, conseqüentemente, uma boa vida sexual na terceira idade.

“Deve-se controlar o colesterol e a pressão arterial e manter um peso ideal através de atividades físicas e uma boa dieta balanceada”, diz o médico.

Mas para os idosos que mantém a atividade sexual, Calixto dá outro importante conselho:

“Deve-se lembrar que sexo envolve cuidados e, mesmo na terceira idade, é necessário o uso de camisinha.

Ultimamente temos vivido uma grande incidência de idosos com doenças sexualmente transmissívies, principalmente a aids”. (DD)

Pessoas buscam envelhecer com autonomia e independência

Para a médica Ivete Berkenbrock, presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia do Paraná, a maior preocupação do idoso hoje é ser feliz.

De acordo com uma pesquisa do Ministério da Saúde, cerca de 10% da população acima de 50 anos sofre de depressão no País.

“O ápice da existência humana continua sendo os 120 anos.

Mas o objetivo não é sobreviver até essa idade, e sim chegar a uma idade avançada bem.

O que se quer é viver uma terceira idade com autonomia e independência”, diz.

Mas na opinião de Ivete, algumas barreiras precisam ser superadas para que os idosos tenham realmente acesso total à qualidade de vida digna.

O Brasil, na opinião da médica, já está tendo que lidar com a realidade de uma população mais envelhecida, que tanto políticas públicas dessa área têm grande destaque nas cidades.

“Em Curitiba um idoso pode viver com bastante qualidade de vida, apesar de ter um inverno rigoroso.”

Em termos de infra-estrutura, a médica destaca a grande quantidade de parques e áreas verdes, mas acrescenta que as calçadas não estão em condições de oferecer boas caminhadas.

Mídia


A médica acredita que enquanto a mídia ajudou a estimular uma mudança no comportamento sexual dos idosos, abrindo o debate nas famílias, a mesma mídia ainda trata a terceira idade como tabu.

“Não vemos comerciais ou marketing dirigidos para essa faixa etária.

E quando existem, eles são colocados em papéis que os ridicularizam, subvalorizando sua experiência e sabedoria”, acredita.

Para ela, uma terceira idade saudável é sinônimo de fatores multidimensionais.

Além de terem que cuidar mais da saúde, com atividades físicas constantes e uma alimentação saudável, a médica destaca a importância do engajamento social.

“Uma pessoa que está em contato com as demais e se sente útil é mais feliz.”

Ivete diz que as doenças que mais acometem os idosos no Brasil, assim como no resto do mundo, são as cardiovasculares, seguidas dos tumores e demências.

“Hoje a tecnologia farmacêutica permite que apesar disso se viva bem.

Mas as próximas gerações de idosos podem ter esperança no desenvolvimento de medicamentos mais eficientes, principalmente com a evolução dos estudos com células tronco”, revela. (DD)

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