quinta-feira, 26 de março de 2009

Epigenética: além da seqüência do DNA

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O hábito de fumar, o uso de esteróides e certas drogas também influenciam as funções genéticas por interagir química ou fisicamente com o DNA

Eloi S. Garcia é pesquisador da Fundação Oswaldo Cruz e membro da Academia Brasileira de Ciência. Artigo enviado para o “JC e-mail”:

Recentes investigações genéticas têm demonstrado que gêmeos idênticos (possuidores do mesmo genoma) apresentam diferenças em seu comportamento e fisiologia.

Por exemplo, eles podem diferir na susceptibilidade a doenças degenerativas e infecciosas.

Por que isto? Quais são as razões? O genótipo ou o genoma de gêmeos idênticos não é o mesmo?

Já o fenótipo – a fisiologia e a função orgânica - é reconhecidamente distinto e diferente.


Somos mais que nossos genes. Os genes não são responsáveis por tudo. Uma nova área, a epigenética, está sendo desenvolvida para explicar estas diferenças.
O termo epigenética existe há mais de cem anos, mas somente C. H. Waddington em 1942 deu uma definição mais precisa a ele.

Epigenética é um campo da biologia que estuda as interações causais entre genes e seus produtos que são responsáveis pela produção do fenótipo.

Pesquisas recentes realizadas sobre genomas e proteomas revelam que esta definição está correta.

Na tentativa de compreender a complexidade da biologia da vida, os cientistas normalmente estudam elementos individuais do genoma.

Seqüências gênicas e proteínas são analisadas para compreender suas interações específicas com outras entidades simples de sistemas mais complexos.

Algumas vezes este enfoque oculta aspectos importantes da biologia, principalmente àqueles de dependem de níveis mais altos de organização genética.

Assim, por exemplo, o genoma não possui somente a informação das seqüências das quatro bases A, C, G e T na cadeia do DNA.

Não resta dúvida de que esta seqüência é importante em termos dos códons, genes e cromossomos. Mas há informações adicionais no genoma dos mamíferos e estas se referem ao epigenoma.

A epigenética investiga a informação contida no DNA, a qual é transmitida na divisão celular, mas que não constitui parte da seqüência do DNA.

Os mecanismos epigenéticos envolvem modificações químicas do próprio DNA, ou modificações das proteínas que estão associadas a ele.

Por exemplo, nas histonas que se ligam e compactam a cadeia do DNA formando a cromatina, o material básico dos cromossomos.

Ou nas proteínas nucleares e nos fatores de transcrição, moléculas que interagem e regulam a função do DNA.

As modificações epigenéticas envolvem a ligação de um grupo metil (-CH3) a base citosina do DNA, particularmente aquela que vem antes da guanina; ligação de grupo acetil (CH3CO-) ao aminoácido lisina no final de duas histonas; remodelagem de outras proteínas associadas à cromatina; e transposição de certas seqüências da fita de DNA causando mudanças súbitas na maneira que a informação genética é processada na célula.

Cada uma destas modificações age como um sinal de regulação e modificação na expressão gênica.

O hábito de fumar, o uso de esteróides e certas drogas também influenciam as funções genéticas por interagir química ou fisicamente com o DNA.

O estilo de vida e exposição ambiental geralmente é diferente entre as pessoas por mais próximas que sejam.

A metilação do DNA e a modificação nas histonas se distribuem pelo genoma e são mais distintas quando os gêmeos idênticos envelhecem e têm diferentes modos de vida.

Isto leva aos fatores ambientais serem responsáveis por mudanças em um mesmo genótipo para diferentes fenótipos.

Existem enzimas que removem os grupos metilas das histonas modificando-as de tal modo que podem induzir a repressão de genes.

Estas diferenças epigenéticas também levam a diferente susceptibilidade a doenças como o câncer, artrites, depressão de desordens psíquicas e emocionais.

Hoje se sabe que enquanto o genoma é o mesmo em nossas células, o epigenoma é diferente em cada uma dos 250 tipos de células diferentes que formam o ser humano.

Fonte: artigo: Eloi S. Garcia,

Jornal da Ciência - SBCP